Precisamos falar sobre sexo?
O tema sempre foi tabu, tanto na sociedade quanto na escola. Mas sim, é nosso papel educar os jovens sobre o sexo e suas consequências
Em 2016, a psiquiatra Carmita Abdo, professora da Faculdade de Medicina da USP, coordenou uma pesquisa que trouxe um dado alarmante: a iniciação sexual dos jovens brasileiros se dá, de modo geral, entre os 13 e os 17 anos. Um ano antes, a Pesquisa Nacional de Saúde Escolar, realizada pelo IBGE, já havia mostrado que, entre os adolescentes do 9º ano do Ensino Fundamental sexualmente ativos, 33,8% afirmavam não ter usado preservativos em sua última relação sexual. Esses dados demonstram que, independentemente da vontade dos adultos, o sexo está, sim, presente na vida dos jovens brasileiros. E com todos os riscos de doenças e gravidez precoce associados à prática, é fundamental que nós, educadores, trabalhemos na educação de nossos alunos para lidar com o tema.
A dificuldade, porém, começa no fato de que, muitas vezes, não nos sentimos confortáveis com esse tema. E esse desconforto não é exclusividade dos professores. Pais e mães, que na maioria das vezes também não receberam educação sexual na adolescência, se sentem igualmente incomodados e tendem a não tocar no assunto. É preciso, porém, reverter esse quadro. Por isso, confira as dicas que elaboramos para ajudar professores e gestores escolares nesse processo.
1. Qual o momento adequado para falar sobre sexo?
Não existe um momento certo para entrar no tema. Ele pode surgir espontaneamente desde a Educação Infantil, trazido pelas próprias crianças. Muitas vezes começa com a curiosidade sobre como os bebês vão parar na barriga da mamãe, especialmente para crianças que estão esperando pela chegada de um irmão. Nas idades mais avançadas, porém, é importante estruturar a abordagem do tema com o intuito de ensinar sobre prevenção à gravidez e doenças sexualmente transmissíveis, especialmente aquelas que não têm cura, como o HIV.
2. Como o professor deve reagir?
O fundamental é que o professor se mantenha aberto para receber as questões que eventualmente cheguem sem ideias preconcebidas ou juízos de valor. Esteja pronto para pesquisar sobre o tema e buscar referências e informações que saiam do campo da opinião para o da ciência (confira a diferença neste outro post). Quanto mais naturalidade demonstrar com o assunto, maiores as chances de estabelecer uma relação de respeito e confiança com os alunos, o que é fundamental para que qualquer aula sobre sexo tenha efetividade. Faça um esforço para entender o que de fato o aluno que traz a pergunta deseja saber e tente descobrir o que ele já sabe sobre o assunto. Essas duas medidas são fundamentais para evitar que você comece a dar explicações longas e detalhadas demais, especialmente com crianças pequenas.
3. Como abordar o tema sexo?
A abordagem muda de acordo com a idade dos alunos. Na educação infantil, por exemplo, a questão normalmente surge associada à gravidez da mãe de algum aluno. É importante estruturar um projeto com brincadeiras e jogos que possam satisfazer a curiosidade, tomando o cuidado para não avançar além do limite de compreensão das crianças.
Mas no Ensino Fundamental 1, descobrir o que as crianças sabem sobre o tema é importante para determinar a forma de atuação. Como os níveis de maturidade são diferentes, é comum que alguns alunos saibam mais do que outros. Se for esse o caso, não é interessante antecipar dúvidas individuais para toda a classe. Uma ideia é criar uma caixinha de perguntas, onde os alunos podem deixar suas dúvidas sobre o tema, dando ao professor um panorama geral do nível de conhecimento da turma. Se algum aluno destoar em termos de conhecimento, vale responder à dúvida individualmente. Abrir espaço para que eles perguntem livremente, ainda que de forma anônima, ajuda a estreitar as relações e a construir confiança. É importante ressaltar que, o tempo todo, você deve usar o vocabulário científico e a nomenclatura correta de órgãos sexuais masculinos e femininos.
E com os mais velhos?
Com os alunos mais velhos, o assunto se torna obrigatório e vai surgir nas aulas de Ciências. A conversa deve ser franca, aberta, e no sentido de sempre difundir a ideia do respeito: pelo próprio corpo, pelo corpo do outro, pelas opções e pelas dúvidas de cada um.
Apenas um ambiente construído sobre os pilares da confiança e da honestidade vai permitir que os alunos se expressem de forma verdadeira, o que é fundamental para que a educação sexual possa atuar sobre as questões reais da vida deles. Porque é importante aproveitar os questionamentos que eles trazem para construir a prevenção às DSTs e à gravidez precoce, que é um problema ainda muito sério. No Brasil, a taxa de gravidez na adolescência ainda é de 62 para cada 1000 jovens do sexo feminino. Muito acima da média mundial, de 44 para cada 1000 (dados da Organização Mundial da Saúde). Sempre lembrando que prevenir a gravidez deve ser responsabilidade tanto delas quanto deles.
4. E o que fazer com os pais?
Sim, problemas podem surgir para conciliar valores familiares e sociais quando o tema do sexo surge na escola. Alguns pais acham que, ao abordar o corpo e a reprodução humana, a escola pode estar despertando as crianças para a sexualidade. Aliás, nesse caso, é importante ter uma conversa franca com a família sobre o papel da escola e deixar claros os limites para cada idade. Tente mostrar a eles que a opção à informação, ou seja, o total desconhecimento, pode levar a consequências muito piores como uma gravidez precoce, por exemplo.
Aliás, mostre que a escola tem uma posição conjunta, referendada pela direção pedagógica. Se necessário, receba os pais reticentes em conjunto com a coordenação e mostre os materiais pesquisados e os especialistas consultados para definir a forma de abordagem do tema.
3 Comentários. Deixe novo
Bom dia. Querendo elaborar um projeto sobre a saúde na escola. Queria ver como e possivel conseguir patrocinio do governo em relação a isso. VCs poderiam me enviar algumas sugestões, idéias?
É um tema delicado, porém de extrema importância até para evitar doenças e gravidez precoce.
Corroboro com a psicóloga e doutora em educação pela UNESP (Universidade Estadual Paulista) Mary Neide Figueiró , ao afirmar: “A educação sexual é o inverso da erotização da criança. Ela tem a finalidade de levar informação e conhecimento sobre tudo o que diz respeito ao corpo, para que as pessoas entendam de onde vieram”