O papel da escola na formação de leitores
O papel da escola na formação de leitores.
A frase do sociólogo e crítico literário Antonio Candido, em seu ensaio O Direito à Literatura, de 1988, é emblemática. Indagando-se sobre a possibilidade de classificar a literatura como uma necessidade básica – ao lado de alimentação, moradia, saúde e educação –, ele conclui:
“Não há povo e não há homem que possa viver sem ela, isto é, sem a possibilidade de entrar em contato com alguma espécie de fabulação”.
Sob essa ótica, o acesso à literatura é classificado como uma necessidade universal, que precisa ser satisfeita. Para que isso aconteça, é preciso que as pessoas não apenas saibam ler, como também descubram o prazer e entendam os benefícios trazidos pela leitura.
No nosso texto de hoje, vamos mostrar por que a literatura é importante na formação de cidadãos, qual o papel da escola na formação de leitores, como o papel da literatura muda a cada fase escolar, como organizar um currículo literário e de que forma nós, educadores, podemos cultivar esse hábito em nós mesmos.
No encerramento do texto, deixaremos um link para o ensaio de Antonio Candido citado no início do texto e para um curso gratuito sobre como ensinar literatura no Ensino Fundamental 2.
Boa leitura.
A importância da literatura
Como bem pontuou Antonio Candido em seu ensaio citado no início deste texto, a capacidade de fabulação é fundamental para a experiência humana. E a capacidade de fabular está no cerne do universo literário.
Por meio da leitura, conseguimos extrapolar nossa experiência cotidiana e ressignificar nossas vivências à luz das interpretações que fazemos e compartilhamos de uma obra literária.
Na escola, a literatura ganha importância por sua capacidade de atuar na formação de cidadãos críticos e conscientes.
Para a Base Nacional Comum Curricular, a BNCC, é por meio da leitura literária que a estudante e o estudante entram em contato com diferentes visões de mundo, ampliam seu repertório para que possam fruir do prazer da leitura, e passam a “reconhecer na arte formas de crítica cultural e política”.
O papel da escola
A escola tem um papel fundamental na formação de leitores principalmente por dois aspectos: é nela que crianças e jovens aprendem a ler e a desfrutar a literatura sob orientação de adultos leitores – no caso, professores e professoras –, e onde elas têm acesso a livros de qualidade.
Para muitas crianças e jovens, aliás, a escola é o principal, quando não o único, local em que elas e eles terão acesso a livros.
Segundo a pesquisa Retratos da Literatura no Brasil, dois dos principais motivos para o baixo índice de leitura no país são o preço dos livros e a falta de acesso a bibliotecas. (Os dados são da edição mais recente da pesquisa, realizada em 2019 pelos institutos Pró-Livro e Itaú Cultural).
A escola assume esse papel de promover acesso aos livros graças às continuadas políticas de aquisição de títulos implementadas pelo Ministério da Educação (MEC) nos últimos 30 anos. A continuidade do Programa Nacional do Livro e Material Didático (PNLD) permitiu a ampliação dos acervos escolares de livros de literatura, resultando na criação de bibliotecas nas unidades de ensino.
Ter o livro, porém, não basta. Para formar leitores de maneira intencional, a escola precisa estar pronta para organizar um trabalho de leitura que seja constante e progressivo. Ou seja, a complexidade da literatura oferecida deve ser ampliada ao longo do percurso das estudantes e dos estudantes.
A literatura em cada fase escolar
É fundamental compreender que o papel da leitura literária muda de acordo com a etapa da escolarização. Na Educação Infantil, ela ajuda na aquisição da linguagem, facilitando a formação de vocabulário e a formulação de frases.
No ciclo de alfabetização, a professora, ou o professor, deve fazer uso de atividades de leitura compartilhada para destacar as regularidades da língua, uma vez que o foco deve estar concentrado em despertar nas crianças a percepção para a estruturação da língua com o objetivo de pensar no que escrever, e de que maneira escrever.
O gosto pela literatura se consolida ao longo do Ensino Fundamental, com a formação de opinião qualificada. Ou seja, mais do que simplesmente dizer se gostou ou não do livro, é importante dar ferramentas aos alunos e alunas para que consigam observar aspectos da linguagem, o tema abordado, a construção do enredo.
Essas ferramentas vão ganhando complexidade à medida em que avançam pelos anos finais do Fundamental, com acréscimo de tópicos como construção de personagem, tipo de narrador e foco narrativo. É fundamental que as alunas e alunos sejam estimulados a expressar suas opiniões em atividades estruturadas, com a produção de críticas e resenhas.
Toda essa estruturação vai fluir melhor se a escola for capaz de organizar um currículo literário para formar leitores.
Como organizar um currículo literário
Para organizar um currículo literário, professoras e professores, gestoras e gestores devem em primeiro lugar responder algumas perguntas:
- Que leitores a nossa escola quer formar?
- Quais os melhores títulos para atingir nossos objetivos?
- Quais práticas de leitura e escrita contribuirão para essa formação?
A partir daí, a equipe pedagógica deve definir suas práticas de leitura buscando promover a aproximação dos alunos e das alunas com os livros. É importante ressaltar esse aspecto para evitar a prática tão comum de se formatar aulas de literatura em que o professor, ou a professora, por exemplo, fale sobre o autor e o momento em que ele cria a obra sem dar aos alunos e alunas a chance de ler a obra em questão.
Para saber mais sobre como criar um currículo literário, visite:
YURIE, Ingrid. Como ter um currículo literário favorece a formação de leitores. Nova Escola, 21 de fevereiro de 2022. Disponível em <https://bit.ly/3WIlxz9> Acesso em 25 de maio de 2023.
Como se tornar um professor leitor
Para que essas estratégias funcionem, é fundamental que você, professora ou professor, seja um leitor proficiente de literatura e tenha intenção pedagógica nas suas recomendações.
Mas, como construir essa proficiência? Será que basta ler a maior quantidade de livros no menor tempo possível? Calma, aqui vale a mesma lógica que mencionamos acima: o desafio deve ser adaptado ao estágio de fluência leitora.
Se você não tem o hábito de ler, comece com leituras curtas, como as crônicas, que dialogam com o mundo em que vivemos e facilitam a interpretação.
Tente iniciar por temas com os quais você já tem familiaridade. A maior facilidade de compreensão permite que você se concentre em outros aspectos da obra.
Finalmente, compartilhe suas impressões com outros leitores. Essa troca é fundamental para ampliar nossa compreensão da obra.
Para saber mais:
CANDIDO, Antonio. O Direito à Literatura. in Vários Escritos. Ouro sobre Azul, Rio de Janeiro, 2011. págs 171-193. Disponível em <https://bit.ly/42bC8MP> Acesso em 25 de maio de 2023.
Literatura no Ensino Fundamental. Curso gratuito com certificação e alinhamento à BNCC. Nova Escola. Disponível em <https://bit.ly/3MD4vOh> Acesso em 25 de maio de 2023.